|
Criavam galinhas, porcos, cabras e até vacas para tirarem-lhes o leite. Feita a colheita, era hora de plantar tudo de novo e enquanto a plantação crescia, o mar estava pronto para as redes feitas de barbante e protegidas por uma resina vegetal extraída da casca da aroeira. Toneladas de peixe eram pescados num mar que não parava de fervilhar de cardumes de sardinhas, xeréus, xereretes, linguados, miraguaias, olhos-de-boi, garoupas e badejos. Como não havia energia elétrica, a conservação era através da salga, que por sinal, é o melhor sistema para se conservar o pescado.
Naquele tempo, em Dois Rios funcionava o presídio para Presos Políticos e o vilarejo era movimentado. Tinha campo de futebol, praças ajardinadas, cinema, padaria, vilas de casas, uma pequena hidroelétrica que chegava a fornecer luz para o Abraão, feiras livres, serrarias, britadeiras, oficinas, em fim, quase uma pequena cidade. Os colonos da Parnaioca vendiam seus produtos para os guardas do presídio e até para os presos que queriam comer algo diferente. Com os recursos dessas vendas, eles remavam até Angra dos Reis em busca do que a terra e o mar não lhes proporcionavam, ou seja: o sal, o açúcar, o querosene, as velas, as roupas e calçados, pilhas para as lanternas entre outros supérfluos da época.
Com o fim do presídio Federal, o Estadual não foi a mesma coisa. Os presos agora eram de outra índole e o Sistema Carcerário parecia entrar na onda deles. Fugas e mais fugas, assaltos à casa de moradores para conseguir abrigo, comida e meio de transporte; assassinatos e o medo constante dos ilhéus ante a expectativa de novas fugas, fizeram os poucos que restaram abandonarem suas terras em busca de melhores condições de vida. Até por que, com o fim do presídio se intensificou a pesca predatória para suprir de matéria prima as indústrias de pescado que proliferaram por toda a Ilha.
As redes não eram mais de barbante cozido, mas de nylon e gigantescas. Não eram mais puxadas à mão, mas por guindastes acoplados nos barcos que não eram mais movidos a remo, mas sim a possantes motores. Em pouco tempo não havia mais um peixe, um único camarão e nem as sardinhas puderam mais ser vistas do alto do mastro numa noite de lua nova. Era o fim de uma cultura caiçara. Ainda hoje em alguns pontos da Ilha, remanescentes desse povo lutam para morrerem onde nasceram, mas em nome da natureza que tudo domina, eles não parecem ter muitas chances. Não pela natureza, mas pela burocracia proposital.
|